4 de dezembro de 2010

Fala...

Eu voltei pra cama
pra te escrever mais um poema sobre partida
porque você continua indo e voltando
e eu não agüento mais esperar
a hora de não ter que me despedir
e te puxar pela mão pra onde quer que eu vá
seu nome no meu pulso e na minha cabeça,
na minha boca pra eu te chamar o tempo todo
e saber se você continua comigo
se nunca mais me deixa, se eu nunca mais espero...
nunca mais ter que esperar, porque eu já te encontrei
e depois desse tempo todo eu continuo aqui sem você
e nada do que eu fiz te trouxe pro meu lado
então você continua
indo e vindo e eu esperando de longe
morrendo de calor e sem te abraçar,
os dias pararam de acabar,
é de noite e eu tenho medo o tempo todo
porque eu chamo e você não responde
você não está aqui, tão longe que não pode me ouvir
então eu voltei pra cama
e cantei as suas músicas e você não me ouviu,
eu estiquei a mão, como se você só estivesse um pouco pra lá
mas eu não conheço o seu lugar
eu não conheço seu rosto
e eu já perdi a conta dos seus segredos,
pra ficar olhando o céu nublado
e sentir que nem a noite acontecia,
o tempo todo parado,
e eu repetindo sempre as mesmas palavras
que não me deixavam mais perto de você,
então a gente ficou em silêncio
e eu fiquei de novo esperando você falar
alguma coisa pra mudar a minha vida
alguma coisa pra me salvar as noites
alguma coisa que fizesse ser dia de novo
pra eu ver amanhecer em cima de nós dois
e a gente passar o resto da vida
contando as horas até pra sempre
mas sempre falta falar alguma coisa...




Henrique Rochelle

2 de novembro de 2010

Eu tentei ler, mas não conseguia. Me doem os olhos. Me faltam as palavras. Eu perco as frases. E o tempo todo eu ergo a cabeça pra ver se você voltou. O tempo todo eu fecho os olhos pra ver se você aparece aqui. Por cima de mim. Me esquentando e me falando sobre o tempo que a gente perdeu. A gente continuava histórias que não existiam. Eu fiquei ali. Inventando por não sei quanto tempo algo pra você fazer parte. Algo pra você estar comigo. E não estava. Nós tínhamos enredos de monte, esperando um final feliz. E como isso não chegava eu virei pro lado e esperei mais um pouco. Você não vem. E com o tempo passando você ia sumindo. Eu não tinha nada que segurar. Nada pra acreditar que você estaria comigo. Você se perdeu do meu lado de dentro. Eu fiquei esperando pra ver se você vinha. Você não vem. Eu não consigo mais te dizer, porque me dói por toda parte e você não consegue fazer nada pra não doer. Então eu fechei os olhos e você não estava mais lá. Eu chorei até não ter mais lágrimas. Eu sempre sonhei demais.

28 de outubro de 2010

Quatro Mãos

Eu tinha uma flor pra te dar
mas ela secou esperando.
Tem coisas que o tempo machuca
e essa noite era pra ter você.



Henrique Rochelle

26 de outubro de 2010

Céu Claro Como se Fosse Cedo e Você Viesse

Eu fiquei ali. Morrendo de medo, deitado e da cama olhando o céu de noite, com aquela claridade que faz parecer que tem luz em todo lugar. Sem chance de conseguir dormir. Abrindo e fechando os olhos e falando com você, com você, com você, e sempre prestes a chorar. Não aceitei sua resposta e morrendo de vontade de gritar pra você mudar de idéia, eu arrumei uma mala toda e trouxe pra cá. Como se a qualquer hora você fosse me dizer que não vive mais sem mim. Mas você não dizia e você não diria. Eu não li nas estrelas, porque a noite estava nublada. Nublada e com luz. Luz demais, que me deixava acordado e te chamando. Onde foi parar o frio? Onde foi parar meu sono? Eu acordo daqui a pouco e sem você. Sem você pra me dar bom dia do outro lado da cama. Eu achava que não ia dormir por causa da chuva. Que não ia dormir por causa do tempo. E eu só não dormia por sua causa. O braço caído pra fora da cama e segurando a alça da mala. Como se eu estivesse prestes a te encontrar e não estava. Como se amanhã eu acordasse pra ser seu pra sempre. Amanhã chegava e eu esperava a madrugada passar, pra levantar na hora e fazer alguma coisa certa, que eu não conseguia te dizer quanto queria. Eu não podia dormir, morrendo de medo de que você não sentisse saudades. Saudade é vontade de estar perto e de tão longe você não me sentia. Eu não podia dormir porque talvez você estivesse dormindo. Acorda. Passa a noite toda em claro e do meu lado. Agora agora agora agora. Muda de idéia! Que eu não posso mais esperar. Eu não posso respirar. Meu nariz tranca e eu não posso dormir. O céu, as nuvens, a noite passando e eu não fecho os olhos, porque não tem você em lugar nenhum. O dia é enorme. E eu conto todas as horas. Sem parar, sem parar. Você não vem. Eu fico aqui morrendo de medo. Você não vem. Não vem. Então eu deito na cama e não consigo dormir. Preso entre o grito e o choro. Preso entre esperar e você indo embora. Cada dia que você não vem eu fico mais sozinho. Cada noite que você não vem eu fico mais perdido. Muda de idéia... Deitado ao contrário, no pé da cama, sem conseguir dormir. Olhando a claridade estranha das nuvens passando como se fossem relógio marcando o tempo que a gente não tem. Você não vem... e eu nunca mais vou poder dormir sem olhar o céu.



Henrique Rochelle

24 de outubro de 2010

Partir

Porque você não parava de partir
eu não sabia onde te esperar
se eu ficava pelo meio do quarto
pra ver se você vem
ou se você corre pra me encontrar
sozinho no caminho sem você
que me deixava sempre e cada vez mais
e eu nunca sabia se voltava
eu nunca sabia se seria meu
então eu rasgava as horas e os dias
como se o tempo fosse papel na minha mesa
e eu levava pra cama dois ou três pedidos
e toda a coleção dos seus nãos
que me deixava sem jeito de querer
e eu continua querendo
sem nem entender como
porque você não parava de partir
e eu ficava pra trás
sem nunca chegar em lugar nenhum
porque não tinha você pra me encontrar
porque você não parava de partir
e eu ficava cantando pra você
que não me ouvia e não me abraçava
e sem entender a distância que você me colocava
eu deitava quieto
de coração partido e sonhando com uma mão
que eu nem sabia se era a sua
porque eu não parava de esperar
e você não parava de partir.



Henrique Rochelle

30 de setembro de 2010

Desperto

E eu, assim, não queria dormir, sem saber o que me esperava ou como eu ia acordar. Espaço demais do lado de dentro e doendo. Espaço demais do lado de lá e esperando. Lá fora os barulhos das pessoas. Todas vivendo e dormindo. No meu quarto eu não dormia. Eu esperava alguma coisa sem saber o que era. Sem saber quem era. Sem saber se alguém viria pra abrir a porta e me dizer bom dia. Continuei acordado.



Henrique Rochelle

24 de setembro de 2010

Parte

Depois eu me perdi
assim
acho que no seu nome
no seu rosto
porque eu não sabia o que falar
e queria fazer mais
parte
disso tudo
com você aqui
pra sei lá
a gente fazer mais sentido
e entender o que a gente
dizia
mesmo quando não era nada
nada importante
e mesmo assim ficava na minha cabeça
porque eu não me acostumei
ainda
com o seu jeito de falar
e com te esperar
sem saber quando você vem
a gente se desencontrando
e eu só querendo
te encontrar
pra acertar alguma coisa
a mais
que faltasse
e não faltar mais nada
no espaço entre nós dois
aqui na minha cama
ou perdidos por ai
porque a noite é enorme
e eu não me incomodo
de não dormir
se for pra ficar
acordado
do seu lado
e eu não sei como
te trazer
me levar
ou te encontrar
meio do caminho ou onde seja
pra poder te dizer
que eu te entendo
mesmo que eu ainda não saiba
como
e que eu quero
demais
fazer parte
mais parte
disso tudo

a maior parte.







Henrique Rochelle

18 de setembro de 2010

Viajando

Era quase primavera.


Passageiro,
queria só pegar a passagem
e partir
destino pra onde fosse
mas o caminho era grande
e tudo parecia mais
longe
com as luzes assim
borrando na velocidade.
Então parou pra olhar
mas era de noite
e tudo estava escuro
demais.
Sem sinal de vida.
Toda a gente dormindo,
muito quieta,
cada um no seu banco.
E do seu lado,
vazio mesmo,
ainda tinha um ombro,
procurando colo
e um sonho pra se ajeitar,
pra se acomodar
no formato do seu corpo.
Porque tinha medo do escuro.
Do caminho e da distância.
Tinha medo de estar sozinho.
E uma vontade
ainda maior
de estar com você.
Sem saber quem era você
mesmo.
Sem saber quem era você
assim, quando já fica de noite
e esfria de repente
e todo mundo por toda parte
já foi dormir
e em silêncio a gente sonha
com uns braços que não conheceu
e espera companhia
pra sonhar junto
porque o caminho é imenso
e a gente sempre pode decidir
descer (juntos)
na próxima estação.


Henrique Rochelle

16 de setembro de 2010

Monstros

“And when he came to the place
where the wild things are
they roared their terrible roars
and gnashed their terrible teeth
and rolled their terrible eyes
and showed their terrible claws”
M. Sendak. Where the Wild Things Are


Porque nós éramos novos demais e não sabíamos muito bem as regras do jogo, nem que jogo era mesmo. Então a gente sempre acabava correndo, assim sem direção, e se batendo. Por acaso e de propósito. Pulando em cima, pra agarrar as costas, grudar nos braços, chutar as panturrilhas, derrubar, voar pra cima com o punho fechado, a mão aberta, segurar na cara e morder o pescoço, morder o rosto todo e arrancar um pedaço do lábio. Porque não sabíamos as regras do jogo, nossos beijos eram mordidas. Mas éramos novos. Novos e correndo pela grama e subindo na árvore e nos escondendo no meio do mato, com desculpas esfarrapadas e as bermudas ainda mais. Descalços e suados, de tarde a gente deitava na grama olhando o céu escurecer e brigava mais um pouco. Era instinto. Era natural. Era uma vontade tremenda que a gente ainda não sabia colocar nas palavras. Éramos novos demais. E brincávamos de gente grande no seu quarto com os seus pais dormindo do outro lado do corredor. Eu nem sei como ninguém acordava, porque a gente se batia, se debatia e gritava. Gritava muito. Ou era só na minha cabeça. E em silêncio escorregávamos as mãos pra dentro do pijama pra descobrir como o corpo esquenta diferente. Eu gostava do seu cheiro. E a gente sempre acabava brigando. Brincando de brigar e brigando de verdade. Sempre começava brigando. Por causa dessa vontade enorme e sem jeito de ocupar o mesmo lugar, a gente se empurrava e se batia até que as mãos esbarrassem nos lugares certos e a gente risse, meio sem jeito, meio culpado, e muito com gosto. No campo, no banho, no seu quarto, na minha garagem, na chácara, na piscina e em qualquer lugar que aparecesse. A gente era muito novo pra se importar. Então a gente se batia. De verdade. De deixar roxo. De ir parar no hospital. De enfaixar, engessar e assinar por cima. A gente mordia pra arrancar pedaço. Do que é que a sua tia chamava a gente? Incivilizados... mas depois a gente aprendeu mais regras. Se vestiu melhor e foi descobrir como é tomar vinho e comer em restaurante caro sem fazer ninguém passar vergonha. E a gente já tinha parado de levar quem pudesse passar vergonha. Só nós dois. Pra depois voltar pro apartamento e parecia que nada tinha mudado. Eu te batia forte. Você me jogava na parede. A gente quebrou três camas, tivemos que nos mudar porque os vizinhos reclamavam, mas a gente sabia as regras do jogo. Do nosso jogo. E a gente brincava de brigar e brigava pra brincar. E estava junto. O tempo todo. Rolando no chão e sempre com alguma coisa quebrada. Uma mão, uns pratos, o som da sala. E ai eu quebrei seus CDs. Você quebrou meu computador. Eu rasguei suas roupas. Você me meu um soco e um beijo, disse que me amava, arrebentou a fechadura e foi embora sem levar sua chave. E eu não sabia mais as regras do jogo. A gente esperou. A gente se viu de novo pra separar o que era de quem. Quem ficava com o braço quebrado, quem arrebentava o supercílio, cada hematoma no seu lugar na nossa conversa. Porque a gente nunca tinha aprendido a brincar de outro jeito. A brigar de outro jeito. Mordíamos cada dia mais forte. Acho que pra ver quem agüentava mais. Eu ainda tenho as marcas. Era pra rasgar, mesmo. Sem saber as regras do jogo, fomos mordendo até não sobrar nada. Dos corações. Os dois de corações mordidos. Devorados. Sem assar nem nada. Eu arrancava seu coração com as mãos e comia na sua frente, e era pra ver se te machucava mais. Porque eu não sabia as regras do jogo. A gente nunca soube brincar.



“Oh please don’t go-
we’ll eat you up – we love you so! ”
M. Sendak. Where the Wild Things Are





Henrique Rochelle

29 de agosto de 2010

Caligrafia

Soube então que voltaria a escrever cartas. Era algo de seu. Aquela caligrafia meio torta, forçosa, tentando dizer por entre as palavras que ele era alguém, mesmo que inventado. E lutando contra os remédios, porque já era hora de dormir, meio que duvidava das teclas. Todas tão padrão, todas tão iguais. Ocupou seis dias buscando outras fontes, mas nada ficava com seu jeito, seu toque, seu traço. E queria. Sua marca e só sua, por toda parte de todos os seus escritos que ele nem tinha mais para quem escrever. Dois dias antes, mandara mensagens para todos os outros, ou quase. E quase nenhuma resposta. Mas nenhuma promessa. Mais nenhum consolo pra esperar que quando fosse de dia de novo e ele já não sentisse tão forte o amortecido dos seus comprimidos, ele pudesse passar algum tempo esperando alguma coisa acontecer. Era só mais uma tarde, mais um dia, mais um livro. Queria ler contos, porque precisava urgentemente conseguir acabar histórias uma vez que começadas. Histórias incompletas, já tinha muitas. Amontoando debaixo do lençol. Sim, ele dormia numa cama lotada de memórias. Memórias escritas, memórias estufadas, memórias acolchoadas. Cobrindo, abraçando, rabiscando, e machucando seus olhos, como o zíper na ponta da capa do travesseiro. Escreveu em seu colchão, num ponto escondido. Mas achava que ninguém veria, então sua frase não existia. Por isso mesmo não a escreveu. Já não sabia. Passava das oito, tinha tomado seus remédios. Não estava apto a dirigir, não estava apto a cuidar de crianças, de panelas no fogo, do barulho dos vizinhos. Não estava apto à sua própria vida, que ele ia sentindo assim, amassada sobre o rosto, como uma camada a mais de qualquer coisa que fosse, amortecendo o impacto, o desejo, o sentido e a sua capacidade de andar, de manter as paredes no lugar, de não atravessar vidros, não cair de escadas, não se jogar de cima de um prédio. Desistira das janelas havia muito tempo. Mas agora, de repente, podia se enganar de novo. Subir e tomar uma dose cinqüenta e três vezes maior do que devia e sentir aquilo tudo passando. Tudo passaria, tinha certeza, porque ele mesmo passava, assim, sob o efeito dos remédios. Menos ele e mais quem quer que fosse e ele não sabia, não conhecia. Não tinha desejos compatíveis. Jantaria gelatina, mas quem era ele sem aquela vontade estranha de comer pipocas às duas da manhã? Não era ele, porque ele se deitava todo dia e não se incomodava com a cama estar sem mais ninguém. Era só a cama. Era só o fim do dia. E por dentro, escurecendo e dominando o mundo, ele sentia seu estômago prestes a explodir. Preto. Vomitaria em nanquim todos os versos que já escrevera, que engolira, que esperara, que guardara para aquele alguém que merecesse e que nunca chegou. Ninguém voltaria pro seu quarto. Ninguém o encontraria ali, morto no terraço, uma poça de nanquim, se esforçando ao máximo para ter a sua caligrafia de volta. Soube então que não voltaria a escrever cartas. Não havia mais destinatários. Não havia remetente.

26 de agosto de 2010

em outras caixas

Eu peguei o que eu tinha e guardei em outras caixas. Quantas vezes você dá um laço no mesmo coração e ainda pode reaproveitar como presente? Aniversários passados de festas vazias. Coroa de flores pra quem já se foi. E eu era assim. Laços desfeitos em gaveteiros pretos do tamanho do quarto todo. Era que eu tinha que ocupar o espaço entre mim e uma mão pra abrir e buscar dentro. Mas, não conta um segredo?, não tinha nada para achar. Minhas fitas amassadas é que ocupavam mais espaço, me deixavam mais cheio de mim. Então eu escolhia caixas novas. E sempre sorria e entregava. Mãos juntas pra dar um coração batendo. Toma. É meu, mas é pra você. E pensando que presente a gente não devolve, eu continuava assim, um espacinho a menos esperando um sorriso a mais pra me fazer mais inteiro. Mas a gente bate em ritmos sem contagem, então eu não sabia como esperar. De volta. Sempre voltava. O laço, a fita, a caixa e o coração. Batendo menos. Batendo fraco. Embrulhado em papel pardo, com um selo que dizia ‘não me escreva, não me procure’. E eu pegava de volta e guardava o resto em alguma gaveta. Caixa nova. Fita nova. Um dia, alguém novo pra desembrulhar esse meu laço, e perder em outras caixas o que eu faço de melhor: laços de presente.